domingo, 12 de setembro de 2010

Uma velha estória (ou não)



Há uma velha estória — tudo bem, eu estou mentindo, não é uma velha estória, é uma que eu escrevi há menos de quinze minutos, mas, por favor, entendam que não há o mesmo tchan em dizer “há uma nova estória” que em “há uma velha história”, daí o uso da licença poética, enfim, continuando... Há uma velha estória de um macaco, um pequenino espécime de
Macaca mulatta que tinha um sonho: ele queria voar.

O macaquinho, que, a princípio, tinha o nome de Reso, uma súbita homenagem a um dos protagonistas da descoberta do Fator Rh, depois passou a ser chamado como o único macaco respeitado por mim, Son Goku, todavia com a derivação chinesa de seu nome, Sun Wukong, o Rei Macaco, e agora, por fim, atende pelo nome de Wu, queria voar. E nada no mundo impedi-lo-ia de tornar o seu sonho máximo uma realidade.

Por dias a fio, Wu pendurava-se em um galho da floresta e mantinha o olhar atento no voo dos pássaros — os Alcippe variegaticeps, os esplêndidos Lophophorus lhuysii e os Paradoxornis paradoxus. Ele esticava suas mãos, tentando, desesperadamente, alcançá-los, os seus olhos marejavam, o seu coração doía e em seus ouvidos ecoavam as palavras dos outros macacos de sua tribo.

— Ele é doido de pedra.

— Ele ainda vai cair dali.

— Alguém não deveria falar com ele?

— De onde veio essa ideia maluca de voar?

— Por que ele não entende que é um macaco como outro qualquer?

— O que há de tão interessante em voar, hein? Balançar de galho em galho é muito melhor!

— Deixem-no em paz, isso é só uma fase, uma hora passará, e não demorará muito: logo, logo, o Wu vai parar com essas sandices e voltará a se comportar como macaco que é.

E em seus dias mais sombrios, Wu desejava do fundo do coração que eles estivessem certos.

Foi então que Wu, em toda sua sorte, finalmente pôde ver um pássaro de muito perto, aproximou-se sorrateiramente da criatura alada e ficou a espiá-la atrás de um arbusto a uma distância segura, de tão concentrado, nem piscava e respirava unicamente quando era de uma necessidade urgente — e todo seu esforço foi recompensado: Wu entendeu porque ele, um primata, não podia voar. Ele não tinha asas.

Mas o que é uma asa senão um membro, ou apêndice, animal, morfologicamente adaptado para o voo independente, excluindo, portanto, estruturas anatômicas que tornam possível o voo rasante como, por exemplo, aquele dos esquilos voadores? Wu compreendeu que nunca poderia voar como os pássaros devido a sua carência de tais membros, todavia isso não implicava dizer que ele nunca poderia voar: Wu tinha imaginação e havia assimilado o princípio por trás do voo — imaginação e compreensão, o que mais é necessário para mudar o mundo?

Wu pegou vários caules de bambu e, usando teias de aranha, juntou-os com folhas grandes de planta, desse modo, construindo um tipo de aeronave cuja vela folhosa tinha uma aparência muito similar a de um triângulo, em outras palavras, Wu, o macaquinho, construiu uma Asa-delta. E levou-a para o topo da montanha.

— O que ele está fazendo?

— Mas que troço estrambótico é esse?

— Como ele fez isso? Parece complicado!

— Por que ele está indo para o cume da montanha?

— Meu Deus! Ele vai mesmo fazer isso?

— Alguém o impeça! Ele vai morrer! Isso é suicídio!

— E não é que o macaco endoidou de vez? Tsc!

Mas as palavras não alcançaram os ouvidos de Wu, o macaco, um pequeno espécime de Macaca mulatta, segurou firmemente nos tubos de bambu da rígida estrutura, correu e correu e, de repente, não correu mais. Não era preciso. Não havia chão tocando os seus pés. Na verdade, não havia nada os tocando. Wu estava voando. Ele havia realizado seu sonho.

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